domingo, 28 de setembro de 2008

Palavras de Um Profeta




Novo dia, tudo velho, mesmos sonhos, mesmos medos, não há o que acrescentar, uma vida de dias sem brilho, de chão sujo, de céu cinza, chuvas tempestuosas, ventos soprantes, comida sem sal, é tudo que posso dizer.

Porém eu resolvera deixar tudo para trás, tudo que ainda não fiz, tudo que eu ainda não fui, é como sepultar quem ainda não morreu, e assim o farei.

Tomo a última dose de café em minha casa, beijo pela última vez os meus entes queridos, saúdo todos que ainda respeito, e tomo caminho, como uma locomotiva que não para em ocasião alguma.

E é assim que no transcorrer de dias e noites, vejo tantos olhos diferentes, e tudo aquilo que não se aprende em livros e revistas.

Passaram-se anos, longos anos, e eu perdido em meio à tantos lugares, em cada um, deixo uma parte de mim, à procura do que ainda não achei.

Em um pequeno vilarejo, no qual eu resolvera descansar e buscar paz, em um dia seco, o chão rachado pelo sol, o vento soprava tão intensamente, cantava em meus ouvidos, os pássaros à sobrevoar o meu céu, estava muito quente, a sede já surgia, mais ainda assim eu me punha à andar, como um cão sem dono, errante, como um barco à vela, empurrado pela força do vento, e a força da falta de vida em meu semblante estrangulado.

Certamente eu já andara por horas a fio, não possuía exatidão de onde me encontrava, o calor aumentava, a poeira subia ainda mais, com o vento que parecia ter pressa. Eis que avisto um casebre, madeira velha, oca, quase podre, o teto era coberto de palha, o chão de terra batida, o clima era simples, talvez eu nunca imaginaria que pudesse sentir tamanha vontade de estar em um local tão inóspito, mas a vontade fazia-se valer.

Havia um sujeito, sua aparência era a de um ermitão, um sábio, um visionário, e isso atraia-me ainda mais. Suas vestes eram da cor da terra, longas, apenas os pés ficavam de fora, pés esses calçados em um simples par de sandalhas de couro. Sua pele era jambo, marcada pelo tempo, pelos já brancos, entretanto a mesma ainda brilhava como o sol e como o ouro.

Tal homem possuía traços finos, olhos verdes como o oceano, barba espessa e branca, seu cabelo era ralo, sua calvície já era evidenciada pelos poucos fios de cabelo que continham em sua cabeça.

Ale eu estava, de frente para o homem, tão semelhante à um homem do deserto. Finalmente após toda a minha observação, lenta e cuidadosamente, o senhor solta palavras que me causaram até arrepios.

- Filho, que faz em terras tão quentes e arenosas, haveria algo que pudesse lhe chamar a atenção por aqui?

Tão pouco o meu interlocutor terminara o seu discurso, tomaria eu a palavra.

- Não sei como me referir à sua pessoa.

Ele tão gentilmente proferiu algumas outras palavras.

- Filho, chame-me apenas de ‘’você’’, certo?

Logo em seguida, eu respondera:

-Perfeitamente. Honestamente, deixei meu lar, meus amigos, minha família, tudo, e tomei as estradas, os mares, os céus, em busca...

E neste momento, faltavam-me palavras. Mas não faltou sabedoria ao ermitão que imediatamente completou o meu raciocínio.

- Então deixastes tudo, abandonastes tudo aquilo pelo que lutou, e tomastes as estradas, o céu, as águas, em busca do que não encontra em tua terra natal, não é?

Não me surpreendia a sua sabedoria, pois aquele olhar sereno demonstrava que aquele indivíduo era único, iluminado.

Tomei fôlego e o respondi:

- Meu senhor, realmente lhe confesso, deixei tudo por algo que ainda falta, notastes perfeitamente, admito.

Suavemente e delicadamente, o ermitão sorria e dizia:

- Filho, compreendo o que sentes, é como um barco que precisa adentrar em águas mais profundas para não encalhar, e você, filho, precisa movimentar-se, precisa de vida, necessitas da liberdade, assim como o pássaro que tens asas, e precisa delas para tornar-se feliz. Seja como um pássaro, abra suas asas, busque o que ainda lhe falta, quem sabe um dia, tornará a viver em tua terra natal?!

Eu refletia à respeito de tudo que aquele bom senhor me dizia, e lhe respondi, após algum tempo:

-O que falas é verdade, procuro por coisas, que sempre me pareceram longe, sempre me senti preso, encurralado, é como se toda a minha verdade ainda estivesse por vir.

Mais uma vez o ermitão sorria levemente e voltava a falar, após fitar-me por longos minutos.

- A tua verdade é a terra, o mar, o vento, a brisa da praia, a natureza, seja livre, viva, o que queres é a liberdade, quando não é livre, não és vivo, sabes disso, apenas repito, para que nunca mais esqueça, o que já nasceu sabendo, apenas repito, não lhe ensino, me entende, filho?

A curiosidade me tomava por completo, como um homem que encontrei no meio de um deserto poderia saber tanto de mim?

Prontamente o interroguei:

- Sabes de mim o que muitos não sabem, ou que ate não acreditam, quando digo. Diga-me, como soubestes de tantos detalhes sórdidos?

O sábio andarilho que parecia enrolar algum tipo de fumo, sacou rapidamente um pedaço velho de papel, encontrado em um dos seus muitos bolsos, e indagou-me?

- Filho, permitiria à este bom velho fumar, enquanto partilho de tua companhia?

Evidentemente eu não negaria ao meu novo amigo um simples desejo.

- Fume o quanto quiser, meu senhor.

Ele agradeceria, tão logo eu concordara com o seu desejo, e falara com tom profético:

- Filho, tudo que temos na vida, é simplesmente o direito de viver, somos todos diferentes, assim como te sentes ávido por conquistas, novidades e mudanças, há quem deseje coisas completamente diferente das que procura, não fazendo que estejas você errado, no final, possuímos apenas a vida, portanto, esteja vivo, antes que a vida já não te permita mais o que ela hoje te oferece.

Certo de tudo que aquele senhor dizia, não poderia fazer outra coisa, senão agradece-lo inúmeras vezes.

Mais uma vez ele tomava a palavra:

- Filho, o meu fumo terminou, sinto as pernas doerem, devido estar sentado por tanto tempo, e preciso seguir adiante, o sol brilha, irei o acompanhar, se me permitir.

Sentia na carne grande saudade deste homem que nem se fora ainda, e que eu mal conhecera. Resolvi propor-lhe um novo encontro:

- Gostaria de vê-lo novamente, para que possamos conversar.

Em tom de despedida, ele me respondia:

- Sim ,filho, nos veremos novamente, o mundo é pequeno, tão pequeno, o sol e a lua nos aproximarão novamente, assim como ocorreu hoje.

Não havia mais o que dizer, simplesmente o olhei, e ele caminhava lentamente, apoiado em um toco de madeira qualquer, sumindo em meio à areia que subia, carregada pelo vento.




3 comentários:

Anônimo disse...

Fala meu amigo, poxa nem sei o q dizer desse texto, gostei muito e como diz no texto seja livre independente de tudo, busque seus objetivos enquando puder, pois não vivemos para sempre para podê usufruir de nosso tempo nesse mundo... um grande abraço e até o próximo post.

Unknown disse...

..."no final, possuímos apenas a vida, portanto, esteja vivo, antes que a vida já não te permita mais o que ela hoje te oferece."

Minha parte preferida, perfeita! Quantas vezes já nos arrependemos de alguma coisa q deixamos de fazer? O problema é q às vezes esquecemos que nao somos eternos, e deixamos pra depois achando que temos todo o tempo do mundo, e aí se perde um tempo precioso. Estamos tão acostumados com a rotina que deixamos de viver, de correr atrás dos nossos sonhos e do sentido da nossa existência para apenas existir, e isso é tão triste!...:(

bjs Romulo, e sempre que atualizar me avisa, pq adoro ler as coisas q vc escreve, me identifico mt com elas..:)

Unknown disse...

* para apenas existir, e não viver de fato, e isso é tão triste..:(